24.11.17

Quando a Honda criou o primeiro airbag japonês, uma história de fiabilidade


O "SRS" (Supplemental Restraint System ou Sistema Suplementar de Retenção), também conhecido popularmente por airbag, é daqueles equipamentos que nos dias que correm já ninguém pergunta se o carro tem ou não, a sua existência é um dado adquirido tanto como qualquer parafuso ou amortecedor.
Mas nem sempre foi assim, há pouco menos de três décadas o airbag era um equipamento reservado aos automóveis de luxo ou topos de gama, no entanto o seu sucesso como elemento de proteção dos ocupantes dos veículos ditou a sua produção em massa e a consequente redução de preços na sua fabricação e implementação, fazendo com que rapidamente passasse de acessório a equipamento obrigatório.

A origem do primeiro SRS data de 1941 e, como seria de esperar, tratava-se de algo muito rudimentar: bexigas cheias de ar. Uma década mais tarde, em 1953, o americano John Hetrick via a sua patente ser registada, a primeira relativa a um airbag. No mesmo ano, três meses depois, o alemão Walter Linderer seguia-lhe os passos e obtinha o registo do seu sistema. Tanto o sistema de Hetrick como o de Linderer funcionavam mecanicamente através de ar comprimido, no entanto o sistema de ar comprimido não se revelou eficaz pois não conseguia encher a almofada suficientemente rápido. Esta ineficácia levou ao desenvolvimento e adoção do atual sistema elétrico e de gás com sensores.

Em 1975, a Honda inicia independentemente o desenvolvimento do seu próprio SRS e, como seria de esperar de quando se cria algo do nada, foi um complicado e longo processo de desenvolvimento e experimentação. A maior dificuldade foi resolver cada problema que surgia e para o qual não se conhecia uma resolução óbvia, tendo os técnicos da Honda que pedir ajuda a peritos de diferentes áreas relacionadas com cada um dos problemas de forma a chegarem a uma resolução eficaz.

A primeira decisão foi escolher qual a opção a seguir no tipo de funcionamento do airbag, através de um sistema de indução de ar a partir do exterior ou de um com uma carga de gás. Depois de várias experiências aos dois sistemas, a equipa da Honda, liderada por Motohiro Okada, optou pela carga de gás. Segundo passo, desenvolver a tecnologia para obter o melhor tempo de acionamento possível.

Quatro anos de experiências depois, constatado num teste de colisão, a Honda conseguiu finalmente que os airbags se insuflassem no momento desejado. Depois deste sucesso, uns meses mais tarde, a equipa inicia o desenvolvimento do sistema com base no enchimento através de gás e pó, cuja conjugação resultava num enchimento mais fácil e rápido, graças ao aumento da temperatura do gás provocado pelo pó.


Em finais de 1982, sete anos depois do início do projeto, a Honda inicia a segunda fase: melhorar a sua fiabilidade integrando-o com o funcionamento dos cintos de segurança.
Para isto, a marca recorreu aos peritos da NASA, a Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço dos EUA, de forma a estudar as técnicas e protótipos relacionados com fiabilidade. Um ano depois, a aprendizagem obtida na NASA permitiu à equipa da Honda assegurar a percentagem de fiabilidade a que se tinha proposto: 99,999%. No entanto, durante a reunião de avaliação, Tadashi Kume, o então vice-presidente executivo da Honda R&D (divisão de pesquisa e desenvolvimento da Honda) queria algo mais ambicioso, exigindo o aumento da percentagem para 99,9999%, isto reduziria as probabilidades de 1 falha em cada 100 mil para 1 em cada 1 milhão. Não parece muito, mas dado o número de unidades que a marca estava a comercializar, ter um carro em cada 100 mil com um airbag que poderia não funcionar a 100% era inaceitável.
"A fiabilidade é a chave da eficácia do airbag." - afirmou Kume durante a reunião.

Todo o sistema voltou a ser revisto pela equipa. Começaram por minimizar o número de pontos de falha únicos (SFP - single failure point - modo de falha no qual o sistema é afetado por uma única falha). Um dos problemas identificados foi a possibilidade de uma falha de contacto elétrico, devido a acumulação de sujidade ou vibração, no anel deslizante que conecta eletricamente o volante à coluna de direção. Para resolver este problema, foi desenvolvido um cilindro em aço espiralado de modo a que se desse um fluxo constante de corrente. Outra situação que poderia gerar problemas era a montagem do cilindro, caso este não fosse montado exatamente no centro, ao virar o volante, poderia ser cortado. A solução foi alcançada através da criação de um mecanismo de centragem automático, permitindo a fácil montagem do cilindro sem afetar a sua fiabilidade.

Alcançar a incrível percentagem demorou cerca de 3 anos e vários possíveis cenários foram testados, sendo o feito comprovado num teste final em que foram utilizados 100 veículos. Cada carro estava equipado com um dispositivo que media as alterações na resistência elétrica do sistema, e cada peça usada tinha sido catalogada através de um sistema de código de barras permitindo identificar que peça tinha sido instalada em que carro.
Este sistema de rastreio viria a ser bastante útil em 1990 quando um defeito foi detetado num lote de insufladores, permitindo uma fácil e rápida identificação dos veículos afetados, tendo a substituição das peças defeituosas sido efetuada num período de dias. Sem o sistema de rastreio, a Honda teria de ter verificado todos os 500 mil veículos vendidos ao invés dos apenas 12 afetados.

Doze anos depois da Honda iniciar este empreendimento, em setembro de 1987, o mercado japonês recebia o primeiro carro japonês com airbag: o Honda Legend.

Na Europa, a disseminação dos airbags só começa nos anos 90, sendo que a Honda seria uma das 4 marcas automóveis a oferecer o sistema de proteção nos seus modelos topo de gama em 1991.



Fonte: Honda
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