Ensaio > Civic Type R GT
Ao fim de 5 anos o "H" vermelho está de volta. Aquele que é o símbolo de potência, de rapidez e de performance da Honda... o sonho de todos os "miúdos" dos finais dos anos 90 que viam no Type R o carro referência para a alteração do Civic "normal" que acabariam por comprar.
O símbolo vermelho foi empregue por vários modelos da marca ao longo das últimas décadas, pelo NSX, pelo Accord, pelo descontinuado Integra e pelo pequeno Civic. Depois de um hiato de 5 anos, o Type R renasce novamente na Europa com a quarta geração do Civic Type R.
DESIGN E EQUIPAMENTO
Tal como o seu irmão não apimentado, o Type R tem um design controverso que ou se odeia ou se adora. Um visual que se destaca no trânsito quotidiano, talvez o hot hatch que menos passa despercebido de entre todos os hot hatchs de produção no mercado, mas que quando levado para a pista acaba por se integrar de maneira subtil no ambiente de competição.
O Type R que ensaiámos estava vestido de branco, o tradicional Championship White dos Type R. A cor que, a par do Cinza Polished Metal, é o meio termo entre a extravagância e a subtileza, sem "esconder" todos os pormenores visuais que destacam o hot hatch. Se a intenção é passar um pouco mais despercebido, então o Preto Crystal é a sua opção. Mas, se prefere o efeito contrário, então as cores Vermelho Milano e o Azul Brilliant Sporty é o caminho a seguir.
O visual do novo Civic Type R foi pensado e desenhado com um objetivo, ser desportivo, agressivo e dizer a todos que o observam: "Eu sou veloz".
Os "extras" não são meras adições visuais, todos estão lá por uma razão funcional. Desde a enorme asa traseira para gerar suficiente força descendente de forma a estabilizar o carro a altas velocidades e aumentar a sua aderência, ao spoiler dianteiro que ajuda a manter a frente no lugar, a todas as entradas e saídas de ar que alimentam o motor e arrefecem toda a mecânica e os travões de discos ventilados e pinças de 4 êmbolos da Brembo, aos alargamentos nas cavas das rodas para alojar as jantes de 19" com os pneus SportContact 6 (235/35) da Continental, sem esquecer na traseira o difusor inferior a alojar as 4 colossais ponteiras de escape.
Mas infelizmente o que contribui para a performance do carro nem sempre é a melhor opção para uma utilização do dia-a-dia. Os alargamentos da carroçaria, embora funcionais aerodinâmica e visualmente, tornaram o Civic mais largo. Para quem conta estacioná-lo em lugares de garagem com algum obstáculo lateral vertical, procure um lugar com mais de 1,90 mt de largura ou terá uma desagradável surpresa.
Outros dois aspetos que requererão cuidados são as aproximações aos passeios e a circulação em estradas com piso em mau estado. No primeiro caso, as jantes de 19" saem ligeiramente das laterais dos pneus o que as torna muito sujeitas a raspadelas, e o facto de serem pretas não ajuda a disfarçar estas mazelas. No segundo cenário, há que ter atenção ao estado do piso onde se circula, pois os pneus de baixo perfil tornam-se um alvo fácil a furos e rebentamentos.
O interior do habitáculo é espaçoso q.b., pintado de preto e vermelho com apontamentos em carbono e alumínio na manete das mudanças, pedais e tapetes. Os materiais são de boa qualidade e não apresentaram barulhos mesmo em pisos mais irregulares ou em pior estado.
Os bancos da frente são umas lindíssimas backets de competição, em vermelho e preto, com um excelente apoio lateral e bastante confortáveis e envolventes. No entanto, tornam o ato diário de entrada e saída do veículo uma verdadeira tortura. Com isto queremos dizer que são excecionais uma vez sentados, mas nada práticos para uma vida quotidiana. Alcançar algo na parte de atrás torna-se uma tarefa de contorcionista e para quem entra e saí do carro várias vezes por dia, só esta ação, torna o Type R num carro bastante complicado para uma utilização "normal".
Seria talvez o caso de ponderar criar um sistema "user friendly" para uma troca fácil de bancos, tornando as backets bancos opcionais para os dias de condução mais desportiva.
Outro fator menos positivo, é a resistência do revestimento das backets nos seus sobressaídos apoios laterais. Com pouco menos de 15.000 km, o revestimento em "veludo" nestas zonas já apresentava desgaste acentuado provocado pelo entrar e sair do carro.
Atrás, os bancos são normais, confortáveis e de bom revestimento, a adotar a tonalidade preta com costuras vermelhas. Para ajudar à diminuição do peso (cerca de 17%), o sistema de bancos mágicos é inexistente no Type R.
A posição de condução é algo que irá depender de cada um, mas confessamos que foi uma luta que nos demos por vencidos. Para quem tenha uma altura mediana, por volta dos 1,65 mt, poderá ter alguma dificuldade em encontrar a posição perfeita. Ajustar a distância aos pedais, volante e ao mesmo tempo a altura ideal para não ficarmos demasiado enterrados, nunca se compatibilizava com a visualização a 100% do velocímetro digital. Acabámos sempre com o aro do volante na frente do visor!
Outro aspeto a reajustar numa versão futura, é a distância entre o pedal do travão e o acelerador. Embora para uma utilização normal estejam bem posicionados, para um carro que se foca na competição e performance, estes dois deveriam estar mais juntos. Quem tenha pés abaixo dos 40 irá por certo ter alguma dificuldade em fazer "ponta-tacão".
A localização dos comandos é boa e relativamente idêntica à do Civic normal, mas onde neste último se encontra o botão Econ está o responsável por energizar ainda mais o Type R, o botão "+R". Do lado oposto encontramos o botão Start | Stop do motor. Ao lado do velocímetro, no ecrã i-MID para além das informações comuns a outros modelos, encontramos informações exclusivas do Type R: o medidor de força G e da pressão exercida nos pedais do acelerador e do travão, a pressão do turbo, da temperatura da água, da pressão e temperatura do óleo, bem como os tempos de aceleração e de voltas (lap time).
Na consola central estão o já conhecido ecrã tátil de 7" com as habituais funções do sistema Honda Connect e GPS, os comandos da ventilação e, entre estes e a manete da caixa de velocidades, a plaquinha com a numeração do veículo. Chamada de atenção para as mãos quando deixar o carro ao sol no verão, a manete das mudanças em alumínio tende a aquecer... e muito.
Depois entre as duas backets temos alguns espaços de arrumação, um deles bastante generoso por debaixo do apoio de braço onde estão as ligações USB e tomada de energia. O apoio de braço é de dimensões um pouco mais reduzidas para não interferir numa condução mais desportiva, mas o suficiente para dar algum conforto numa viagem mais relaxada.
Para além do equipamento base, o Type R GT vem ainda equipado com sensores de chuva, de luz, e de estacionamento à frente e atrás, ar condicionado automático bi-zona, sistema de suporte dos máximos (HSS), luz ambiente, iluminação interior ambiente vermelha (forro portas dianteiras), linha vermelha na saia traseira e dianteira, entre outros. A câmara traseira auxiliar ao estacionamento e o sistema de travagem ativa em cidade (CTBA) são equipamentos base comuns às duas versões do Type R.
Na bagageira do Civic Type R não encontramos pneu sobressalente (menos um para contribuir para o peso) mas encontramos espaço, bastante espaço. Na generosa bagageira de 475 lt da versão GT (com os encostos dos bancos traseiros levantados) encontramos um cofre debaixo do piso, dois arrumos nas laterais com a sinalização de emergência, o compressor e o kit de reparação de pneus.
Com os encostos rebatidos e carga até à janela, a capacidade da bagageira do Type R GT aumenta para os 1191 lt. Na versão de entrada os valores são ainda melhores, 498 lt com bancos na posição normal e 1214 lt com encostos rebatidos.
MOTOR
O motor... ahh o motor... o responsável por todo o alarido em torno do novo Type R, o primeiro do seu género, o primeiro VTEC Turbo 2.0 a ser aplicado num Honda, aquele que é responsável pelo "soco" no peito e pela sensação de adrenalina quando revela todo o seu binário... podíamos ficar aqui o dia todo a escrever metáforas, descrever sensações e cenários já muitas vezes ouvidas por quem já experimentou o hot hatch... e todas são verdade, pode acreditar.
Para além do motor de 1996 cc e 4 válvulas, que é, sem dúvida, uma obra de arte, o Civic Type R aloja debaixo do capot uma manada de 310 poderosos cavalos disponibilizados às 6.500 rpm e um binário de 400 Nm entre as 2.500 e as 4.500 rpm, comandados por uma caixa manual de 6 velocidades com diferencial de deslizamento limitado muito bem escalonada.
Devido ao comando variável da distribuição (VTC), que permite um excelente desempenho tanto a baixas como altas rotações, a 6ª velocidade é tão boa que quase nos esquecemos das outras... pelo menos até querermos sentir novamente o "soco" de energia!
E a melodia produzida por esta fábrica de potência e adrenalina??... o batimento cardíaco do Civic Type R é caraterizado por um som rouco que nos revela a presença de um carro com algo mais, um som rouco tão gostoso como o ronronar de um gatinho que, no entanto, se transforma no rugido de um leão se for cutucado... um som rouco natural, proveniente de um coração vivo e de uns escapes que nasceram com o "bicho", e não proveniente de um qualquer apêndice aftermarket para simular algo que não pode ser simulado.
O bendito som que todos os carros deveriam ter...
CONSUMOS
Calor, muito calor... foi assim que esteve o clima durante todo o
período do ensaio, bem a condizer com a cor vermelha do espírito do hot hatch, ainda que a sua cor fosse o branco Championship.
Para
a carteira não sofrer, sofremos nós um bocadinho com a falta
intencional do ar condicionado, enquanto íamos circulando com as janelas
abertas na esperança de arrefecer o habitáculo. Fica o aviso aos futuros proprietários, pé direito
pesado e ar condicionado não conjugam com a palavra economia. Aqui está
um cenário algo familiar a quem tem ou teve um HR-V da primeira
geração.
Considerando tudo o que o Civic Type R é, não podemos dizer que seja gastador... pelo menos numa condução normal e algo cuidada.
A
sua média combinada de 7.5 lt/100km é bastante conservadora para um carro
destes, no entanto se fizermos o gosto ao pé direito, ligarmos o modo
"+R" e ainda por cima quisermos ar condicionado, o consumo combinado
aumenta facilmente para valores de 12 a 14 lt/100km.
O test-drive de pouco mais de 400 km caraterizou-se essencialmente por percursos
citadinos (50%) com muitas situações de paragem/estacionamento e vias
rápidas, mas também de nacionais (40%) e auto-estradas (10%)... e claro, muito "+R" à mistura. No final, a média combinada foi de 11.9 lt/100 km, tendo ficado ainda com
uma autonomia para mais 69 km. Ainda assim, o Civic Type R conseguiu médias mínimas de 6.0 lt com uma condução calma, continua e linear.
COMPORTAMENTO E SEGURANÇA
"Um carro de corrida para a estrada", é assim que a construtora nipónica define o Honda Civic Type R e a definição não podia estar mais correta. De tão correta está, que quase não seria um carro para a estrada.
O Type R foi desenvolvido com foco no desempenho, na velocidade, na resposta precisa da direção e suspensão, nas prestações e sensações extasiantes que transmite. A aceleração é arrebatadora, a suspensão adaptável e a aerodinâmica trabalham em conjunto com uma direção precisa de uma forma extraordinariamente eficaz, mantendo o carro no caminho desejado como se este se deslocasse sobre carris virtuais, mesmo quando abusamos um bocadinho mais. Claro que se o levarmos aos extremos podemos eventualmente ter uma surpresa pois, por melhores que sejam a suspensão e o diferencial autoblocante, o estado do piso da maioria das nossas estradas vai interferir bastante na aderência do Type R.
E depois temos também o vicioso botão "+R", o culpado pela mutação do
Type R, onde tudo fica "+"... mais nervoso, mais responsivo, mais
ajustado, mais rápido, mais guloso, mais duro, mais preciso, mais
sonoro, mais vermelho.
Quando carregamos no botão "+R", o painel de instrumentos adquire uma tonalidade vermelha, junto ao velocímetro surge um "+R" vermelho, as luzes convergentes do indicador de aceleração aparecem como se estivéssemos num fórmula 1 para nos indicar a melhor altura da próxima mudança de velocidade e o Type R fica mais rápido (essa diferença nota-se e bem), a suspensão ajusta-se e o carro fica mais preciso a curvar e 30% mais duro, tão duro que quase apostaríamos sentir cada minúscula imperfeição da estrada, de tal forma que notamos o nunca antes notado, o piso da autoestrada não está minimamente direito!... damos por nós aos saltinhos como se estivéssemos a passar por juntas de dilatação! Isto para não falar nos pavimentos empedrados... definitivamente a suspensão "+R" não é para a maioria das estradas portuguesas. Aliás se a suspensão em modo normal já é ligeiramente dura comparada com a dos carros normais, comparada com a suspensão em modo "+R" é um verdadeiro sofá confortável.
O melhor é deixar o "+R" reservado para as voltas nos circuitos fechados, para o mundo real o modo normal chega e sobra.
Segundo a marca, o carro faz dos 0-100km/h em 5,7 segundos e tem uma velocidade máxima de 270 km/h (não tivemos a oportunidade de confirmar, mas acreditamos piamente que é possível), nada mau para um carro de tração dianteira com quase 1400 kg. O poder de aceleração chega a ser viciante, no entanto, assegure-se de que tem estrada suficiente para o gozar. Vai perceber rapidamente que a noção de distância vai ficar mais curta e a estrada vai acabar rapidamente.
Já referimos o "soco" de adrenalina quando o acelerador é pisado a fundo??
Outro aspeto agradável em ter 310 cv à nossa disposição é na altura das ultrapassagens. Ultrapassar três ou quatro carros de uma vez, passa a ser a mesma coisa que ultrapassar um ou dois num carro de 120 cv.
E é por isto, que damos por nós a esquecer a insuportável dureza da suspensão e carregamos novamente no "+R"...
Quanto à segurança, o Civic Type R vem com uma série de equipamento de base e extra para a versão GT bastante completa. Contando com 8 airbags, ABS, distribuição eletrónica da travagem (EBD), assistência à travagem (BA), assistência à estabilidade do veículo (VSA), assistência ao arranque em subida (HSA), alerta de esvaziamento dos pneus (DWS), avisador de colisão à frente (FCW), reconhecimento de sinalização de trânsito (TSR), avisador de saída de Faixa (LDW), informação ângulo morto (BSI) incluindo monitor de trânsito lateral (CTM).
VALORES
O Civic Type R GT está disponível a partir de 43.280€ (sem pintura metalizada e despesas de logística).
VEREDITO
Do que gostámos?
Som
Direção precisa
Travões
Modo "+R"
Comportamento da suspensão
Resposta do motor e transmissão
Consumos (sem ar condicionado)
A melhorar?
Revestimento das backets nos apoios laterais
Relação da posição de condução/volante com a leitura do velocímetro
Concluindo, o novo Civic Type R é um "brinquedo" impróprio para cardíacos, um pecado delicioso que só deve ser abusado de vez em quando. É daquele tipo de carros que, como os clássicos, sai à rua de vez em quando para "esticar as pernas".
Se tiver mesmo de o ter, e a não ser que só conduza uma vez por dia, vai chegar à conclusão de que necessitará mesmo de um carro "tradicional" para o dia a dia. Ou então, pertencerá ao clube exclusivo daqueles que prefere a imagem e estilo ao conforto e praticabilidade, mesmo que isso signifique suportar a ginástica da entrada e saída imposta pelas backets e o desconforto de uma suspensão dura.
Esteticamente o Type R é ao mesmo tempo consensual e controverso, é daqueles carros que não conseguem deixar de dar nas vistas. Por isso, espere o virar de cabeças de transeuntes, de motociclistas ou do condutor do carro ao lado... ou de trás... espere ter pessoas a puxar do telemóvel para tirar umas fotos. Tal como ter um cão, é um bom "amigo" para quem quiser fazer novos conhecidos.
No entanto, não deixa de ser uma máquina fabulosa e eficaz, com uma condução viciante e um som delicioso. E mesmo com todos os aspetos desajustados a uma utilização quotidiana, só queremos é voltar a meter a moedinha, entrar e dar mais uma voltinha!
C. Ruivo